“Uma Batalha Após a Outra”, com Leonardo DiCaprio, usa a paternidade como pano de fundo e deve figurar no Oscar 2026

Paul Thomas Anderson acaba de lançar “Uma Batalha Após a Outra”, aposta para o Oscar 2026, um filme que, assim como “O Agente Secreto”, transforma a paternidade em trincheira emocional, política e brutalmente contemporânea

Gabriel Amora
amoragabriel@ootimista.com.br

Paul Thomas Anderson é, há mais de uma década, meu melhor amigo (platônico). Não nos conhecemos pessoalmente, claro, mas foi como se tivéssemos, em 2012, numa sala de cinema quase vazia do shopping Iguatemi Bosque, quando assisti a “O Mestre” pela primeira vez. Fiquei em choque. Pelo filme, obviamente, mas também pela solidão de conferir aquilo sem alguém por perto, como se a experiência fosse feita só para mim. E talvez tenha sido. Aquela história sobre fé, obsessão e, sobretudo, paternidade, me marcou de um jeito irreversível.

Algum tempo depois, encontrei “Sangue Negro”, também de PTA, em DVD, na finada Distrivídeo. Quis levar, mas uma senhora acabou pagando mais caro pelo item. Dias depois, para minha surpresa, meus pais me presentearam com o mesmo filme, sem saber da minha admiração pelo diretor. É curioso como esses pequenos acasos acabam criando uma mitologia pessoal para quem ama cinema. Desde então, Paul Thomas Anderson nunca mais saiu do meu mundo: está na minha estante, na minha família, na minha cabeça, na minha pele.

Por isso, quando “Uma Batalha Após a Outra” foi anunciado, com Leonardo DiCaprio no papel principal, entendi que um novo reencontro estava marcado. E ele veio (só que foi diferente). Desta vez, diretor e ator finalmente dividem o mesmo set, décadas depois de quase colaborarem em “Boogie Nights”, obra que DiCaprio recusou para estrelar Titanic. Agora, no auge de suas carreiras, os dois entregam o longa mais urgente, furioso e politicamente incisivo de toda a filmografia de Anderson.

Aqui, o cineasta exibe o seu primeiro filme ambientado na atualidade desde “Embriagado de Amor” (2002). Enquanto a filmografia recente dele preferiu navegar pelo passado, entre guerras, mitologias e falências morais, em “Uma Batalha Após a Outra” ele mergulha de cabeça no caos do século 21, um tempo confuso, frenético e bagunçado. Nesse cenário, o filme se desenrola como um jogo em constante mudança. A fotografia em VistaVision cria imagens grandiosas e quase alucinógenas, enquanto a trilha sonora de Jonny Greenwood guia o espectador por uma tensão que transita da comédia ao desespero mais profundo. No meio desse turbilhão, DiCaprio vive um ex-revolucionário cansado, lutando para sobreviver num mundo que parece regredir rapidamente — e, sobretudo, para proteger a filha, a última esperança do que pode salvar.

Livremente inspirado em “Vineland”, de Thomas Pynchon, o mesmo autor de “Vício Inerente”, que Anderson já havia adaptado, o longa abre mão da fidelidade literal para reimaginar os conflitos do presente: imigração, racismo, militarização e luto. Diante deste redemoinho, após uma conversa com um grande amigo do cinema, não consigo deixar de enxergar “Uma Batalha Após a Outra” e “O Agente Secreto”, de Kleber Mendonça Filho, como primos ideológicos. Apesar dos contextos distintos, ambos respiram a mesma urgência política e exploram a tensão entre o indivíduo e as estruturas de poder, questionando como proteger quem amamos em tempos marcados por vigilância, fascismo, repressão e desintegração institucional.

E é aí que voltamos à paternidade: o elo mais profundo da minha conexão com Anderson. Bob, vivido por DiCaprio, e a filha Willa, interpretada com delicadeza por Chase Infiniti, são o coração pulsante do trabalho. Pelo esforço deles de permanecerem juntos, apesar do caos que os cerca, “Uma Batalha Após a Outra” encontra sua centelha de afeto. Não há redenção fácil ou soluções milagrosas, mas existe afeto, cuidado e a luta pela sobrevivência.

No fim das contas, o filme fala sobre continuar, mesmo quando tudo parece desmoronar. Sobre filmar o que parece impossível de capturar. Sobre amar aquilo que parece condenado. E, acima de tudo, sobre manter a fé, não em finais felizes, mas na próxima batalha que ainda vale a pena ser travada.

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Filme “Uma Batalha Após A Outra”
Já disponível nos cinemas
Ação, Comédia
Duração: 2h 42min
Classificação indicativa: 16 anos

 

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