O que é ser feliz? A que a felicidade estaria ligada? Como cultivar alegria? Esses e outros questionamentos tentam ser respondidos em “Ser Feliz: é possível?”, palestra inédita que acaba de ser ministrada por Monja Coen em Fortaleza. A missionária fala ao Tapis Rouge acerca do encontro e o tema de sua reflexão
Onivaldo Neto
onivaldo@ootimista.com.br
Ao ser questionada sobre qual seria o principal ensinamento da palestra “Ser Feliz: é possível?”, que ministra Brasil afora, Monja Coen responde com um pedido: “Despertem! O momento chegou para toda a humanidade despertar e apreciar a vida em seus múltiplos aspectos transitórios”. Inspirado no seu livro homônimo de 2024, o encontro desembarcou em Fortaleza, mais especificamente no Teatro RioMar, neste fim de semana, reunindo diversos admiradores da missionária – maior representante do Zen Budismo no País. Espiritualidade, autoconhecimento e bem-estar foram temas que se mesclaram na palestra, que busca refletir de maneira profunda acerca do verdadeiro sentido da felicidade. Ao Tapis Rouge, a monja zen budista dá detalhes sobre a conferência e divide sua visão sobre o tema que a norteia.
TR – A palestra é inspirada em seu livro homônimo de 2024. O que a motivou a transformar o livro nesse evento? O que você traz da publicação para a palestra?
Monja Coen – O livro intitulado “Ser feliz: é possível?” surgiu de um diálogo entre Gustavo Arns, um estudioso dos aspectos mentais da felicidade, e eu. Gustavo promove todos os anos, em novembro, na cidade de Curitiba, o Congresso Internacional da Felicidade. Tenho sido convidada repetidamente a participar do Congresso, de onde surgiu ideia de Gustavo de conversarmos sobre o pensamento budista e a Ciência, visto que ele fez vários cursos nos Estados Unidos sobre a Ciência da Felicidade. Todos queremos ser felizes, mas entendemos de forma diferente o que seja a felicidade. Refletimos na palestra sobre o assunto. Não posso falar sobre o aspecto científico, sobre pesquisas e comprovações. Posso falar sobre budismo, sobre encontrar o contentamento com a existência e poderemos refletir sobre o que é esse estado chamado de felicidade.
TR – O título da sua palestra, “Ser Feliz: é possível?”, já sugere uma dúvida. Na sua visão, por que a felicidade, que parece ser um desejo universal, é vista por muitos como algo tão difícil de ser alcançado?
Monja Coen – Será que a felicidade é difícil de ser alcançada? “Está sempre onde a pomos, e nunca a pomos onde nós estamos”. Frase conhecida, antiga, de um poeta brasileiro [Vicente de Carvalho]. Mas, quando estamos presentes em nós, no que estamos fazendo, sendo excelentes em cada atividade, estamos produzindo bem-estar e saúde. Ser feliz, é possível? Sim. Quando criamos causas e condições que geram tranquilidade, harmonia, paz e amor. Cabe a cada pessoa manifestar e provocar em si e no mundo esse estado de plenitude – onde nada falta e nada excede.
TR – A senhora propõe uma união entre os ensinamentos milenares do Zen Budismo e as descobertas da ciência moderna. Poderia nos dar um exemplo de como a sabedoria budista e a ciência se encontram na compreensão do que é a felicidade?
Monja Coen – A felicidade, um estado de satisfação e contentamento pode ser apreendida, aprendida e praticada, através do equilíbrio e do autoconhecimento. Nossas escolhas e responsabilidades, o conhecer a si e perceber o funcionamento da mente são os primeiros passos para uma vida feliz. A neurociência comprova o que Buda dizia há mais de 2.600 anos. Sugiro que leiam o meu livro “Ser feliz: é possível?”.
TR – Para você, qual é a maior ilusão que temos em relação à felicidade atualmente?
Monja Coen – Há muita propaganda e programas de televisão, filmes, novelas, que compreendem e estimulam um estado de alegria perene – ganhar na loteria, ganhar prêmios, ter objetos de valor – carros, iates, casas, joias, como sendo condutores a um estado de felicidade. Certamente a fome, a miséria, a falta de recursos materiais, as enchentes, os desastres naturais não são fontes de alegria e bem-estar, mas podem nos levar a compreensão mais profunda do sentido da vida. Será que esse encontro com os significados mais íntimos e sutis da existência não seriam elementos básicos para uma vida plena? Podemos, entretanto, procurar algo mais profundo e sutil – contentamento com a existência de tal forma que até mesmo as enfermidades, perdas e desconfortos podem ser elementos que nos levem a nos tornarmos pessoas melhores. Será que isso não é verdadeiramente ser feliz? Buda dizia que quem conhece o contentamento é feliz mesmo dormindo no chão. E quem desconhece o contentamento é infeliz em um palácio celestial. Como você se sente? Reflita, perceba e descubra se o seu estado de plenitude é um estado profundo e sutil ou se são apenas momentos breves, passageiros. Aliás, nada nesta vida é estável ou permanente – por que não podemos ser felizes na instabilidade também?
TR – Em uma sociedade marcada por ansiedade, imediatismo e excesso de estímulos, qual seria a primeira e mais simples prática que uma pessoa poderia adotar para começar a trilhar um caminho em direção a uma vida mais feliz?
Monja Coen – Podemos iniciar a jornada através da percepção clara do funcionamento da mente humana. Voltar a Delfos e a famosa frase “Conhece-te a ti mesmo”. Momentos de silêncio, de autorreflexão, de empatia, de gratidão, de respeito e de gentileza geram em nós e no mundo um sentimento de plenitude e bem-estar. Olhar o céu e os mares. Banhar-se de matas e florestas. Falar com estrelas e grãos de areia. Reconectar-se com a natureza que é a nossa natureza verdadeira. Apreciar a vida e a si mesmo. Reconhecer-se o sagrado manifesto. Ser gentil e hábil em amar, querer bem e cuidar. Quem cuida é sempre cuidado. Sorria mais e reclame menos. Ame de verdade, sem esperar nada em troca. Faça o bem sem objetivo de recompensa ou medalhas. Viva de forma ética – pense no bem de todos. Saia do ‘eu’ no singular e adentro a primeira pessoa do plural. Somos, intersomos – todos interligados. Ao perceber essa comunhão passamos a ser cuidadores e gentis, afinal, todos querem ser felizes. Mergulhe no mar. Mergulhe no seu mais íntimo e se reconheça em cada criatura. Tenha vida saudável – medicina do estilo de vida nos ajuda muito a ser feliz. Cuidar de si é cuidar da sacralidade da vida. Escolha um estilo de vida saudável e leve. Aprecie sua vida.