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Destaque no cinema e na televisão, Cláudio Jaborandy fala da carreira e da cultura no Brasil

Com uma carreira construída com sucesso em várias telas e palcos, Cláudio Jaborandy é um poço sem fim de boas histórias. Em entrevista exclusiva ao O Otimista, o ator revisita passagens de sua vida artística, em mais de 30 anos de ofício, desde os tempos na Espanha aos bastidores das filmagens em um garimpo abandonado 

Sâmya Mesquita 

samya@ootimista.com.br 

Cláudio Jaborandy, pernambucano de nascimento, mas cearense de coração, já viveu desde personagens que despertam o rancor do público, como o “Seu” Aldo (Malhação – 2017), a verdadeiros gênios artísticos, a exemplo de Emygdio de Barros (Nise: O Coração Da Loucura – 2015). Na vida real, o ator distancia-se do primeiro, vivendo longe da violência, mas se aproxima do segundo, ao respirar arte em cada novo desafio. 

Desde sua formação, na Universidade Federal do Ceará (UFC), até o mais recente trabalho na TV, na novela Além da Ilusão (2022), passando por prêmios internacionais, Jaborandy se tornou um exemplo para muitos artistas, que almejam uma trajetória semelhante. O ator esteve em Fortaleza a convite do 16º For Rainbow – Festival de Cinema e Cultura da Diversidade Sexual e de Gênero, e conversou com O Otimista sobre a carreira, o processo criativo de cada trabalho e o que espera da cultura neste período de mudanças no âmbito político. Confira os principais trechos! 

O Otimista – Sua relação com o Ceará é muito particular. Apesar de ter nascido em Pernambuco, é aqui que está boa parte de suas primeiras memórias? Por quê? 

Cláudio Jaborandy – O Ceará é a minha terra. Nunca me senti pernambucano e nem de nenhum outro lugar. Fui criado aqui, vim para o Ceará muito novo. A minha vida toda foi aqui em Fortaleza. 

O Otimista – Apesar de ter se graduado na UFC, você foi estudar em Barcelona, na Espanha. O que essa experiência de morar fora do País e ficar imerso em uma cultura diferente trouxe para a sua vida enquanto artista? 

Jaborandy – Para mim, foi importante porque fui fazer Escola de Cinema em Barcelona. Até então, tinha vontade de fazer Escola de Teatro, porque era um ator de teatro. Mas, para isso, tinha que fazer uma prova oral em catalão e não tinha como eu aprender tão rápido. Então, acabei optando pela Escola de Cinema. E aí foi muito interessante, porque tudo que sentia de trava, de timidez com as câmeras, pude, aos poucos, esquecer, mesmo que trabalhando por trás delas. E foi um tempo vivendo a experiência de cuidar de um filho pequeno em outro país. Não foi uma coisa fácil! Sair do calor do Ceará para encarar temperaturas negativas na Europa… O primeiro ano foi bem complicado, depois foi ficando mais tranquilo. Acabei fazendo Cinema e depois não parei mais. 

O Otimista – Das diversas produções em que atuou, qual foi a que mais te marcou e te acrescentou, como ator e na vida pessoal? 

Jaborandy – Todas, né? Ou quase todas. Mas tem filmes que foram muito importantes na minha vida, que tenho um carinho muito grande. Não gosto muito de ouvir minha voz. Mas tem filmes que você faz, a experiência que você adquire, as pessoas com quem você trabalha… Eu poderia citar Amor?; O Amor Não Acaba às Quinze e Trinta; Gonzaga: De Pai Pra Filho; Nise: O Coração da Loucura…  

O Otimista – Latitude Zero (2000) é, sem dúvida, um dos projetos que projetaram sua carreira nacional e internacionalmente. Mas, talvez, as gerações mais novas não conheçam a produção, que traz uma história de amor num garimpo abandonado. À época, como foi participar deste trabalho?  

Jaborandy – Existem filmes que ficam muito datados. Era um filme difícil porque era baseado numa peça do Fernando Bonassi. Foi gravado praticamente em uma só locação, com dois atores em cena. Então, foi bem desafiador para uma primeira experiência de longa-metragem. Marcou muito porque a gente tinha que se virar para prender atenção do público. Foi gravado num garimpo desativado; nós ficamos lá por quatro semanas. Era a emoção de você ter onça na porta do seu quarto. Tem gente que odeia e tem gente que gosta muito. E lembro que, nos festivais aqui no Brasil, às vezes as pessoas me destratavam por causa do filme. Tinha gente que ficava muito revoltada no cinema. E a peça de teatro é ainda mais cruel. 

O Otimista – Já em Malhação: Viva a Diferença (2017), a galera mais nova vai se lembrar da sua atuação como o “Seu” Aldo, o pai do Tato. Como é chegar a esse público mais jovem, ainda mais interpretando uma relação tão complicada de pai e filho? 

Jaborandy – Era complicado, porque gerava uma antipatia. Tenho essa sorte desse tipo de personagem, sabe? Mas era tão curioso porque a equipe de diretores, todos ficavam muito a fins de dirigir as cenas. A gente se divertia muito fazendo. Era engraçado porque o Aldo era um personagem que estava meio desgraçado na vida, bebia, mas, como era Malhação, não podia beber. Interpretava ele bêbado, mas não bebendo. (Fazer) Televisão é muito gostoso. Dizem que novela é para os fortes, porque te obriga a ser mais rápido. Você tem que pensar rápido, não dá para deixar a peteca cair. 

O Otimista No cinema, você esteve em grandes produções, como Nise: O Coração da Loucura, mas também em filmes independentes, como Araguaya – A Conspiração do Silêncio (2004). Pessoalmente, prefere atuar em filmes de maior alcance do público ou em produções independentes e, por isso, mais livres? 

Jaborandy – Gosto de bons roteiros! Gosto de trabalhar bons personagens, por mais que pareçam estranhos, mas trazendo temas interessantes. Faço tantos personagens violentos que optei pela vida, em viver a não violência. Pelo menos, encontro esse lugar em mim que me acalma, me aquieta. Estou ali atendendo a uma história que essas pessoas precisam. Elas precisam vir à cena. As pessoas precisam discutir e falar sobre isso. É puxado, mas é bem gratificante. É a tentação de fazer um bom trabalho. Eu não fico, “Ah, eu preciso fazer um filme de bilheteria”. As coisas vão acontecendo na minha vida, sejam grandes projetos ou projetos mais autorais. 

O Otimista Há mais de duas décadas, o Cine Ceará já reconheceu seu trabalho como melhor ator no curta O Prisioneiro (2001). Como vê o crescimento do cinema cearense? 

Jaborandy – Acho que a gente tem que produzir mais cinema. O Ceará tem uma luz sensacional. E muita coisa foi produzida durante a pandemia. Isso é maravilhoso! Eu me sinto orgulhosíssimo em ser cearense, sabe? Estava lá no encerramento do For Rainbow e é tão interessante reencontrar as pessoas que fizeram parte da minha vida, que me viram começar como ator. Nós temos diretores, roteiristas, atores e atrizes ótimos. 

O Otimista Em Shaolin do Sertão (2016), você foi dirigido pelo cearense Halder Gomes. Como é atuar em filmes do seu Estado? 

Jaborandy – Adoro fazer comédia. Eu sou uma pessoa engraçada, por incrível que pareça – porque as pessoas me confundem com os meus personagens. E é tão interessante conviver com o Falcão, com todos aqueles humoristas. A galera até cansa de tanto rir porque todo mundo é muito engraçado o tempo inteiro.  

O Otimista No filme Nise: O Coração da Loucura, você interpretou magistralmente o também artista Emygdio de Barros. Você se identificou com o trabalho do pintor, em algum momento? 

Jaborandy – No começo, eu fiquei achando que não ia dar conta. Pensei: “Cara, por que eu me meti nisso?”. Quando nós fomos para o Hospital (fazer o laboratório para a personagem), eu fui ao Museu do Inconsciente, toquei nas obras do Emygio. E lembro que fui à enfermaria com dois outros atores. Estávamos lá quando chegou um “cliente,” olhou pra mim e disse: “Você veio aqui roubar minha energia”. Eu sai e ele repetiu. Na terceira vez que ele disse, falei pra ele: “Foi isso mesmo que vim fazer aqui”. Aí ele me pegou pelo braço, me levou até o quarto dele, levantou o colchão e me mostrou uma revista. Pensei: “Ai, meu Deus, eles são muito libidinosos”. Na hora que eu olhei, era uma Bravo! (uma das mais importantes publicações sobre arte da imprensa brasileira). Cheia de obras de arte! A gente começou a conversar e, quando olhei para a janela, lembrei de um quadro do Emygio. Porque ele fazia autorretratos, sempre subjugados. E eu me vi em uma tela dele. E se eu ‘tava com dúvidas se eu ia dar conta ou não, olhando para a janela, eu pensei: “Meu Deus do céu, muito obrigado!” 

O Otimista Como você vê se desenhando o futuro da Arte no Brasil? Quais suas esperanças e medos, principalmente quando se fala do cenário cearense e nordestino? 

Jaborandy – Espero que as coisas melhorem, né? Que a gente possa ter mais apoio. O País precisa de cultura, de dinheiro, de espaço, de respeito. A gente precisa também respeitar a nossa cultura, a nossa arte, os artistas locais. Parar com essa coisa de só valorizar “artista de televisão”. Somos todos artistas nas nossas cidades. 

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