Premiado em Veneza com o Leão de Prata de Melhor Direção, “Coração de Lutador: The Smashing Machine”, novo filme de Benny Safdie traz o astro Dwayne Johnson em atuação transformadora, já cotada ao Oscar 2026
Gabriel Amora
amoragabriel@ootimista.com.br
Após anos de colaboração criativa com o irmão Josh, o diretor Benny Safdie estreia o primeiro trabalho solo. “Coração de Lutador: The Smashing Machine” é protagonizado por Dwayne “The Rock” Johnson, astro da ação e comédia, que assume um papel bastante diferente dos que o consagraram. Safdie mergulha na história real de Mark Kerr, um dos nomes mais icônicos do wrestling, do vale-tudo e do MMA americano. O resultado é um filme que, embora parta de um universo saturado por clichês do gênero esportivo, encontra profundidade ao focar nas dores silenciosas do protagonista. Curioso observar que a obra também se revela uma poderosa narrativa sobre recomeços, tanto na trajetória do diretor, que inicia uma nova fase após anos de parceria, quanto na do próprio The Rock, que abraça o drama e expande alcance artístico.
A partir disso, o filme constrói um retrato íntimo e sombrio de um homem dilacerado por dentro. Celebrado pela força física, Mark Kerr enfrentava fora do ringue uma realidade bem diferente, marcada por crises emocionais, dependência química e complexo de abandono. Ainda que traga passagens reconhecíveis do gênero esportivo, como sessões intensas de treino e obstáculos superados com esforço, “Coração de Lutador” se afasta da glorificação das vitórias para mergulhar nas dores invisíveis de quem parece invencível.
Diferente de obras motivacionais como “Rocky’ ou “Menina de Ouro”, o filme se aproxima muito mais da crueza apresentada por Darren Aronofsky em “O Lutador”, que revelou uma das grandes performances da carreira de Mickey Rourke. The Rock surpreende quando é apresentado entre planos abertos, que evidenciam a imponência física, e planos fechados, que capturam vulnerabilidade, gentileza e tristeza. Ainda assim, Safdie não romantiza o personagem. A masculinidade tóxica também está presente: Kerr ignora a existência da companheira e demonstra respeito quase reverencial apenas pelos homens ao redor, inclusive aqueles que o machucam.
Felizmente, a atuação de Johnson é contida, doce e comovente. É fácil se conectar ao personagem, e o estilo quase documental das imagens contribui para que o espectador sinta tanto o carisma do herói quanto o desconforto diante de suas falhas. Há uma sensibilidade rara na maneira como Safdie retrata o abuso de substâncias, quase como se, por trás da câmera, resistisse em aceitar que aquele homem fosse capaz de tamanha autodestruição.
Deslizes
Ainda assim, a obra não está livre de tropeços. A montagem, por vezes, desacelera demais e introduz passagens prolongadas que comprometem o ritmo da narrativa. Além disso, o MMA impõe um desafio notável à linguagem cinematográfica. Ao contrário do boxe, mais coreografado e visualmente expressivo, as lutas da categoria se desenvolvem majoritariamente no chão, o que torna mais difícil construir cenas de impacto. Safdie, apesar do esforço, não consegue extrair a mesma tensão e dinamismo dessas sequências, o que enfraquece uma parte essencial da jornada do protagonista.
Apesar de suas limitações, o que realmente sustenta “The Smashing Machine” é o retrato cuidadoso de seus personagens. Mais do que uma narrativa sobre lutas ou glórias, o filme se firma como uma homenagem àqueles que, mesmo com talento e presença marcantes, foram deixados à margem por um país que ajudaram a representar. O que emociona é perceber, além das aparências e do espetáculo, a humanidade de figuras visionárias cujas histórias foram engolidas pelo tempo. Safdie dirige com empatia e precisão, fazendo de sua obra um gesto silencioso, mas potente, de lembrança, respeito e reparação. Vale conferir!
serviço
Filme “Coração de Lutador: The Smashing Machine”
Já disponível nos cinemas
2h 04min
Classificação indicativa: 16 anos