Com texto afinado e ótimas atuações, “Três Graças” mostra que um novelão raiz não sai de moda

Há dois meses no ar, “Três Graças” traz uma mocinha cativante, uma vilã promissora e um texto bem amarrado. A direção atenta e o elenco entrosado brindam a experiência de assistir à novela das 21h da TV Globo

Danielber Noronha
danielber@ootimista.com.br

Substituir o remake de “Vale Tudo” não era uma tarefa das mais fáceis. Afinal, não é de bom-tom emplacar outra vilã após o sucesso retumbante de Odete Roitman, interpretada com maestria por Débora Bloch, certo, meu bem? Sabendo que seria um desafio de uma monta muito alta, o novelista Aguinaldo Silva decidiu correr por fora e se ocupou em entregar ao público a melhor mocinha do horário nobre desde Clara, interpretada por Bianca Bin, em “O Outro Lado do Paraíso” (2017). A personagem em questão é Gerluce, de “Três Graças”, defendida com unhas, dentes e um carisma excepcional por Sophie Charlotte.

Acertos
A atriz de 36 anos tem nas mãos uma personagem cheia de camadas e dilemas, que convence pela simplicidade e encanta pelo realismo. Todo mundo conhece uma Gerluce na vida real: a mulher corta um dobrado para ver tudo dar certo ao fim dia, às custas de um esforço quase sobre-humano. Com uma mãe doente, uma filha grávida na adolescência e uma patroa que é osso duro de roer, não deu outra, foi amor à primeira vista. Gerluce é palpável e evoca torcida. Quem assiste já anseia pelo seu tão sonhado final feliz.

O desfecho está longe de acontecer, tendo em vista que o folhetim está no ar há apenas dois meses, mas não tem como negar que Aguinaldo Silva, em parceria com Virgílio Silva e Zé Dassilva, tem entregado exatamente o que carecia o horário nobre da TV Globo: um novelão com todos os atributos que compõem o gênero, sem vergonha de ser exatamente aquilo que está no DNA de uma telenovela. Tanto é que são constantes as homenagens a algumas características do gênero e a nomes que já trabalharam com Aguinaldo, como o diretor Wolf Maia, através dos zoom em cenas de tensão.

Ainda no quesito direção, seria injusto olhar com uma lupa para a trama sem passar pelo trabalho de Luiz Henrique Rios. Diante do que tem sido apresentado, ele parece estar disposto a entregar seu melhor em “Três Graças”. As cenas dirigidas por ele têm vida, movimento e dinamismo. A câmera acompanha com precisão a aflição, a inquietação e a felicidade dos personagens. Ele projeta as cenas de modo que introduz o espectador na casa da vilã Arminda (Grazi Massafera) e nas vielas da Chacrinha – favela fictícia do subúrbio paulistano. Todo o apuro estético torna as cenas críveis, do roubo da estátua ao drama da adolescente que engravidou e vai vender o bebê, este último ilustrado muito bem pela atriz Alana Cabral, que vive Joélly, a filha de Gerluce.

Três Graças
Murilo Benício e Grazi Massafera têm rendido ótimas cenas como Ferette e Arminda (Foto: Globo/Manoella Mello)

Outro ponto alto, apesar de não carregar o mesmo peso da saudosa Odete Roitman, a Arminda defendida por Grazi Massafera tem servido ótimos momentos. Além de render boas cenas com Raul e Josefa, interpretados por Paulo Mendes e Arlete Salles, respectivamente, Grazi tem construído uma vilã extremamente promissora e com camadas que devem render desdobramentos interessantes em um futuro próximo. Em pouco tempo de novela, ela já começou a dar remédios falsos para mãe, empurrou a melhor amiga na frente de um ônibus e infringiu incontáveis direitos humanos.

Cortes
Buscando reverter a baixa audiência, a Globo decidiu celebrar o ritmo da novela e cortou o equivalente a 11 capítulos, centrando-se nos dilemas de Gerluce e antecipando acontecimentos de peso para a trama, como o já mencionado roubo da estátua da casa de Armida e o aparecimento de Rogério, ex-marido da megera, dado como morto até então. Du Moscovis dá vida ao misterioso que voltará em breve para atormentar a ex-esposa e o ex-sócio, Santiago Ferrette (Murilo Benício).

As mudanças trouxeram bons resultados e a novela ganhou um movimento mais fluido, sem repetição de certas cenas e abrindo destaque para que outros personagens pudessem brilhar, a exemplo de Lorena (Alanis Guillen) e Juquinha (Gabriela Medvedovski), que já ganharam uma legião de fãs nas redes.

Ao final desses dois meses, o saldo é bastante positivo e a novela ainda reserva ganchos promissores, como a volta de Rogério, a descoberta do caso entre Armina e Ferette por Zenilda (Andréia Horta) e as consequências da expropriação da estátua por parte de Gerluce. Para completar, Aguinaldo Silva se mostra, a cada capítulo, disposto a entregar momentos icônicos, como fez em “Senhora do Destino” (2004) e “Tieta” (1989). Aguardemos os próximos capítulos.

 

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